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10 novembro 2005

A Verdade (de Mentirinha, Claro!) Sobre os Bebês

Pense em todos os títulos de livros "Alguma Coisa de A a Z". Pode ser que o que lhe vem à mente são uma série de manuais estúpidos, escritos dum modo que é quase impossível a um leitor chegar ao seu final. Por isso, a primeira advertência que deve ser feita à respeito de "A Verdade Sobre os Bebês de A a Z" de Ian Sansom, é para não se enganarem com seu título. Digo isso porque inadvertidamente um leitor poderia supor que se trata de um livrinho chato de um pediatra qualquer, contendo informações sobre o que se deve saber antes do nascimento de seus filhos. E o livro de Sansom está muito longe de ser chato. A começar pelo seu visual, uma belíssima capa, que inclusive ficou entre os dez finalistas do prêmio Jabuti na categoria. Ao folhear o livro, encontramos uma série de verbetes, sobre assuntos diversos, que foram registrados pelo autor durante o primeiro ano de vida de seu filho, em pequenos pedaços de papel, guardados dentro duma caixa de sapatos.


"A Verdade Sobre os Bebês de A a Z" é um livro de reflexões sobre os fatos que permeiam a vida por ocasião do nascimento de um bebê. Citações de grandes autores, como Vladimir Nabokov, George Orwell, Samuel Beckett, Thomas Mann, Edgar Allan Poe, D. H. Lawrence, Shakespeare e outros, se espalham pelo texto, relacionando-se com cada tópico. Sansom é uma amante da literatura, inclusive escrevendo sobre literatura no London Review of Book, e talvez tenha tido a intenção de fazer com que os grandes escritores de todos os tempos falassem ao grande personagem de sua vida, o bebê. Alguns comentários são atrativamente filosóficos - algo como os aforismos de Wittgenstein sem a parte chata. Por exemplo, em certo trecho o autor afirma:
"Ter um bebê é ser como Jonas: estar vivo, mas, de algum modo, ser também vomitado de volta à vida."

No tópico "Crescimento", ele pergunta:
"Quando pedregulhos se tornam pedra?
Quando pedras se tornam rocha?"


Em outros trechos, o autor explicita um amor paterno que é, ao mesmo tempo, comovente e divertido:
"Numa fralda de linho você parece clássico, majestoso, egípcio."

E o que não falta no livro são as descobertas que servem como conselhos para os mais corajosos que realmente desejam embarcar nesta deliciosa (e muitas vezes árdua) jornada que é ter um filho. A experiência recém-adquirida do autor lhe permite afirmar, por exemplo, que macacões são roupas de trabalho feitas para os adultos e que, portanto, não servem muito bem aos bebês de menos de seis meses. Enfim, o livro é uma valiosa coleção de frases filosóficas, irônicas, amorosas, mas sobretudo perspicazes.

O único defeito do livro parece ser algo inevitável: com a tradução para o português os verbetes originais são embaralhados e lemos numa ordem diferente do que foi escrito originalmente. Assim, embora os verbetes possam ser lidos de forma independente, surge a curiosidade de saber como a obra foi organizada no idioma original. Mas é um defeito que, como dito antes, parece ser inevitável já que os verbetes estão alfabeticamente ordenados, e de nenhum modo confunde ou causa estranhamento ao leitor.

Embora a tal 'verdade' dita no título seja apenas uma ironia e revelações grandiosos sobre como criar filhos não são esboçadas, "A Verdade Sobre os Bebês de A a Z" abre nossos olhos para algo que anda um pouco fora de moda: o extraordinário mundo transformado por uma nova vida. A beleza da vida de verdade.
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