As Melhores Introduções da Literatura Brasileira
Entre o início e o fim de um livro muita coisa acontece. Em alguns casos, começamos a ler um livro que parece desinteressante e aos poucos aquele livro vai nos cativando, até que ao final tentamos ler o mais devagar possível a fim de que o livro não acabe. Mérito para esses grandes livros. No entanto, existem aqueles que são grandes de outra maneira. Às vezes pegamos um livro que acreditamos que vai ser uma boa leitura e logo de cara somos surpreendidos de forma muito positiva. Às vezes, somente a introdução da obra já é uma mini obra-prima. Parágrafos que parecem ter sido escritos com uma genialidade próxima da perfeição. Lógico que começar a ler uma obra com uma introdução excelente é muito mais envolvente e gostoso.
O exemplo clássico para mim é o livro "O Ateneu", de Raul Pompéia. O histórico da ocasião é o seguinte: estava cursando o ensino médio e a professora de literatura (aliás uma das responsáveis pela paixão que tenho pela literatura) recomendou a leitura da obra. Haveria posteriormente uma prova então surgiu aquela obrigação de leitura. Com expectativas muito baixas, apanhei a obra e iniciei a leitura torcendo o nariz. O segundo parágrafo está praticamente tatuado dentro do meu coração, como um dos parágrafos mais bem escritos da literatura brasileira. Depois dele (que li e reli várias vezes) li o livro todo numa sentada e terminei o livro fascinado. Observem:
Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo — a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida.
A obra despertou em mim a curiosidade de buscar mais informações a respeito do autor e fiquei profundamente impressionado com sua biografia: tinha um temperamento explosivo que despertou grandes inimizades e bate-bocas entre os intelectuais da época (parece que até marcou um duelo com Olavo Bilac, que acabou não acontecendo). Por causa deste temperamento suicidou-se, num dia de Natal, aos trinta e dois anos de idade. O reflexo deste temperamento pode-se notar por toda a obra, que é muito pessoal, embora é claro, seja ficção. As críticas que faz ao sistema de ensino do colégio Ateneu parece ser na verdade uma forma que ele encontrou de relembrar sua infância, um período aparentemente muito difícil para ele. Com tudo isso em minha mente, cada vez que leio e releio o parágrafo acima, sinto que o autor sintetizou perfeita e belamente todas essas inquietações pessoais, o que torna este único parágrafo uma grande obra-prima.
Abaixo transcrevo o meu segundo exemplo de introdução perfeita:
Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.
Para os que ainda não conhecem o texto, estas são as primeiras frases de Clarice Lispector no seu romance "A Hora da Estrela". Não sei o que há ali que causa tanta atração, mas desde que li pela primeira vez, fiquei admirado pela beleza e simplicidade do texto. É interessante que sempre que leio o trecho acima, lembro-me de um outro sim. No documentário "Anthology" dos Beatles, em certa parte, John Lennon fala da primeira exposição de Ono, que ele foi visitar. Havia uma obra com uma escada e uma lupa amarrada ao teto. Quando ele apanha a lupa para ler uma palavra escrita, o que ele encontra? "Sim", apenas isso. E foi o suficiente para causar um impacto enorme nele. Acho que este é o segredo do texto, o "sim". Um simples advérbio, com uma capacidade poderosíssima de atração. Nem é preciso dizer que o livro também foi devorado após essas palavras.
Finalizar uma excelente obra é sempre uma sensação maravilhosa. Um prazer que parece sempre se ampliar, a cada boa obra que lemos. Mas poucas são as obras que realmente parecem abrir os braços para nós, convidando-nos a sentir esse prazer desde o início. Claro que é muito bom sermos cativados aos poucos e sentirmos satisfação ao final. Mas quem não gosta de um livro que parece fazer um carinho logo de início? Para estes, sempre há um lugar especial na nossa estante.
O exemplo clássico para mim é o livro "O Ateneu", de Raul Pompéia. O histórico da ocasião é o seguinte: estava cursando o ensino médio e a professora de literatura (aliás uma das responsáveis pela paixão que tenho pela literatura) recomendou a leitura da obra. Haveria posteriormente uma prova então surgiu aquela obrigação de leitura. Com expectativas muito baixas, apanhei a obra e iniciei a leitura torcendo o nariz. O segundo parágrafo está praticamente tatuado dentro do meu coração, como um dos parágrafos mais bem escritos da literatura brasileira. Depois dele (que li e reli várias vezes) li o livro todo numa sentada e terminei o livro fascinado. Observem:
Eufemismo, os felizes tempos, eufemismo apenas, igual aos outros que nos alimentam, a saudade dos dias que correram como melhores. Bem considerando, a atualidade é a mesma em todas as datas. Feita a compensação dos desejos que variam, das aspirações que se transformam, alentadas perpetuamente do mesmo ardor, sobre a mesma base fantástica de esperanças, a atualidade é uma. Sob a coloração cambiante das horas, um pouco de ouro mais pela manhã, um pouco mais de púrpura ao crepúsculo — a paisagem é a mesma de cada lado beirando a estrada da vida.
A obra despertou em mim a curiosidade de buscar mais informações a respeito do autor e fiquei profundamente impressionado com sua biografia: tinha um temperamento explosivo que despertou grandes inimizades e bate-bocas entre os intelectuais da época (parece que até marcou um duelo com Olavo Bilac, que acabou não acontecendo). Por causa deste temperamento suicidou-se, num dia de Natal, aos trinta e dois anos de idade. O reflexo deste temperamento pode-se notar por toda a obra, que é muito pessoal, embora é claro, seja ficção. As críticas que faz ao sistema de ensino do colégio Ateneu parece ser na verdade uma forma que ele encontrou de relembrar sua infância, um período aparentemente muito difícil para ele. Com tudo isso em minha mente, cada vez que leio e releio o parágrafo acima, sinto que o autor sintetizou perfeita e belamente todas essas inquietações pessoais, o que torna este único parágrafo uma grande obra-prima.
Abaixo transcrevo o meu segundo exemplo de introdução perfeita:
Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.
Para os que ainda não conhecem o texto, estas são as primeiras frases de Clarice Lispector no seu romance "A Hora da Estrela". Não sei o que há ali que causa tanta atração, mas desde que li pela primeira vez, fiquei admirado pela beleza e simplicidade do texto. É interessante que sempre que leio o trecho acima, lembro-me de um outro sim. No documentário "Anthology" dos Beatles, em certa parte, John Lennon fala da primeira exposição de Ono, que ele foi visitar. Havia uma obra com uma escada e uma lupa amarrada ao teto. Quando ele apanha a lupa para ler uma palavra escrita, o que ele encontra? "Sim", apenas isso. E foi o suficiente para causar um impacto enorme nele. Acho que este é o segredo do texto, o "sim". Um simples advérbio, com uma capacidade poderosíssima de atração. Nem é preciso dizer que o livro também foi devorado após essas palavras.
Finalizar uma excelente obra é sempre uma sensação maravilhosa. Um prazer que parece sempre se ampliar, a cada boa obra que lemos. Mas poucas são as obras que realmente parecem abrir os braços para nós, convidando-nos a sentir esse prazer desde o início. Claro que é muito bom sermos cativados aos poucos e sentirmos satisfação ao final. Mas quem não gosta de um livro que parece fazer um carinho logo de início? Para estes, sempre há um lugar especial na nossa estante.
<< Home