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08 abril 2005

James Joyce e Os Mortos

Desde a primeira vez que ouvi falar em "Ulisses" de James Joyce, fiquei imensamente curioso em conhecer a obra. Dos livros que li, posso dizer que este foi o livro que mais cuidados eu tive para poder aproveitá-lo melhor. Em primeiro lugar, li a "Odisséia" de Homero para reconhecer os paralelos da história em "Ulisses" e buscar algum significado desses paralelos. Também antes de lê-lo, procurei conhecer um pouco da linguagem de Joyce por ler primeiro os contos de "Dublinenses". Confesso que o começo da obra foi uma decepção para mim. Esperava alguma revolução de estilo, tal qual "Ulisses", mas tudo parecia simples. Gostei de um e outro, mas nenhum de forma especial, até que cheguei ao último, que já não esperava ter nada demais. Havia me enganado, mas foi muito bom ter me enganado. Li o conto sem esperar nada e conclui o texto muito satisfeito e surpreendido. O conto "Os Mortos" é realmente uma pequena obra-prima.

"Os Mortos" é o mais famoso conto de "Dublinenses" e é relativamente simples. Gabriel Conroy é casado com Gretta. Após a festa de Ano Novo, organizada pelas tias de Gabriel, ele e Gretta vão para um hotel, já de manhã. Gretta permanece pensativa, praticamente ignorando seu marido, que acaba perguntando a ela qual era o problema. Gretta diz estar pensando numa canção que ouvira durante a noite e revela que aquela canção era cantada por um ex-namorado. Suspeitando que ela ainda está apaixonada, Gabriel insiste no assunto e Gretta revela que ele, na verdade, estava morto. O conto se encerra com Gabriel ouvindo a neve “cair brandamente – como se lhes descesse a hora final – sobre todos os vivos e todos os mortos”.

O tema central do conto obviamente é a mortalidade do ser humano, o que fica claro desde o título do conto. Mas, é muito mais do que isso. A descrição da festa de Ano Novo é um exemplo claro da habilidade que Joyce possuía para descrever cenas, sublinhando aspectos que parecem sem qualquer importância. Em meio aos diálogos curtos sobre uma diversidade de assuntos, pode-se imaginar Gabriel pensando em sua esposa e depois, quando eles estão retornando ao hotel, ele pensa nos momentos felizes que já passaram juntos. Descobrimos depois, que ao mesmo tempo em que isso ocorre, Gretta vive em outro mundo de lembranças, lembranças da juventude, do antigo amor e quem sabe também as possibilidades de felicidade que este amor teria proporcionado se não tivesse sido tão prematuramente interrompido pela morte. Os dois, portanto, estão juntos fisicamente, mas separados em seus pensamentos. Esta distância vai se tornando cada vez mais maior a medida que o fim do conto se aproxima. Gabriel imaginando que vai ter uma noite daquelas e no fim da noite permanece somente com seus pensamentos enquanto Gretta dorme. A frase final, portanto, fecha o conto reforçando a idéia do isolamento, da inabilidade que temos para realmente conhecer outros, mesmo os mais próximos dos seres humanos.

Hoje, percebo que a grande virtude dos contos de “Dublinenses” é que apresentam personagens comuns em atividades comuns da época, mas de uma forma marcante. A complexidade do estilo e texto em obras como “Ulisses” e “Finnegan’s Wake” são revolucionários, mas a simplicidade das histórias de “Dublinenses” estão aí para provar que James Joyce, acima de tudo, era um escritor com grande talento.
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