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11 janeiro 2005

Os Grandes Finais

Já ouvi diversos comentários de que a grande obra brasileira de todos os tempos é "A Pedra do Reino" de Ariano Suassuna. Gente como Cora Rónai e Marcelo Tas já fizeram grandes elogias a obra. Mas o fato é que a obra termina muito mal. O último quarto do livro em alguns momentos chega a ser ruim, como quando Quaderna, durante o depoimento, se diz cego. Isso não é nenhum mistério, já que o próprio escritor revelou sua insatisfação e que o romance teria uma continuação, que nunca saiu. Ao falar sobre o relançamento da obra, Suassuna inclusive afirmou que esta seria revista e modificada em alguns pontos. Apesar disso, o romance é fantástico, os três primeiros quartos são um primor de literatura.

Mesmo assim fico me perguntando porque muitos livros bons têm finais ruins ou decepcionantes? Será que é mais fácil criar uma grande obra do que terminá-la? É estranho imaginar que algum escritor se propôs escrever uma grande obra sem saber ao certo aonde gostaria de chegar. Nesta questão, Kafka é o maior (e melhor) dos paradoxos. Suas principais obras nem foram acabadas e, por isso, não podemos afirmar que possuam um 'final'. E mesmo assim possuem os melhores finais da literatura. "O Castelo" chega a cometer o insulto de acabar no meio de uma frase! Mas em momento algum se tem a sensação de que a obra foi "apressada" para que chegasse logo o final. Talvez essa tenha sido a maior das virtudes de Kafka: sua paciência. Parece que a cada linha de "O Castelo", principalmente nas finais, vemos o escritor ao lado dizendo: "Relaxa, ainda tem muita coisa pela frente". Mesmo na obra "O Processo", em que aparentemente o final foi escrito, não se nota nenhuma preocupação em que o livro acabe. Aliás ler ou não o último capítulo de "O Processo" não faz a menor diferença. O círculo já se fechou, tudo está perfeito. Nos contos, onde os finais foram realmente colocados, Kafka é ainda mais perfeccionista. Criar um conceito, dominá-lo e ainda arrebatar-nos com uma conclusão grandiosa só se consegue sendo um mestre. É o que Kafka faz em "O Artista da Fome", um dos melhores contos da literatura mundial. A pantera na jaula dá uma forte sensação de "conjunto", ou seja, temos a certeza que ela deveria estar ali ao final. Teríamos colocado ela ali se tivéssemos o poder de criação de Kafka. Os finais de Kafka simplesmente ampliam sua obra. Ao contrário do teatro, onde as cortinas se fecham, nas obras de Kafka as cortinas se abrem e podemos ver melhor sua beleza.
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