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20 novembro 2007

Breves Comentários

O Palavra, do Le Monde Diplomatique, publicou minha resenha sobre o livro "A Estrada" de Cormac McCarthy (que aliás está em promoção no Submarino, então se você ainda não leu, clica no link e compra logo). Clique aqui para acessá-lo.

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A Copa de Literatura se aproxima da sua final. Não viu ainda? Então vai lá no site acompanhar, que os textos estão cada dia melhores.

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Alguém me falou que eu devia 'profissionalizar' meu blog, escrevendo regularmente com uma pauta delimitada para cada dia da semana, ou contatando jornais e revistas para publicar meus textos e deixar o blog apenas como forma de divulgação, assumindo de vez o rótulo de 'crítico literário'. Afinal de contas, por que atualmente só se fala em 'profissionalização' de blogs? Por que essa obsessão das pessoas em assumir certos títulos, como se o argumento de alguém que se auto-denomina isso ou aquilo fosse válido apenas por seu caráter 'profissional'?

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As perguntas acima foram escritas agora e talvez não dizem exatamente quais são minhas preocupações, de modo que estou pensando em ressuscitar o meu outro blog "O Escritor de Mentiras", mas para ser blog-só-blog e não um meio para divulgar qualquer coisa. Tem hora que tenho vontade de escrever textos que não têm nenhuma relação com a literatura e tenho a maior preguiça de criar mais um blog para isso, correndo um sério risco do surto passar e eu matá-lo depois de uns meses, mas é que agora eu realmente preciso escrever um monte de coisas sobre o que eu penso de mais um monte de coisas.

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Sim, divago e não estou bem hoje. Também desconsidere o 'breves' aí do título.

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09 novembro 2007

O que é qualidade literária? - Parte III

Referências Geográficas

O espaço em que se passa a ação está intimamente ligado ao modo como algumas obras foram escritas. Por exemplo, não é por acaso que o título da obra-prima de Guimarães Rosa leva em conta a geografia de seu romance: "Grande Sertão: Veredas". Ler a obra sem saber nada sobre o sertão de Guimarães Rosa é perder a maior parte do romance. Isso porque o romance é composto de dualidades (a linguagem entre erudita e popular, a sexualidade de Diadorim, o bem e o mal em Riobaldo, etc.) e o sertão é a peça principal para fixar esses contrastes. O sertão de Rosa possui leis específicas que moldam os personagens e a aridez do lugar é transportada para a linguagem do narrador ou como ele diz é "onde o pensamento da gente se forma mais forte que o poder do lugar".


Outro exemplo na literatura nacional da utilização do cenário para moldar um romance é a obra "Vidas Secas" de Graciliano Ramos. Os ciclos da seca nordestina são reproduzidos na forma como são ordenados os capítulos e novamente a linguagem curta, direta e seca tenta aproximar o leitor da paisagem da caatinga. Daí, quando Fabiano – o sertanejo que foge da seca – se confronta com elementos da cidade sua incompreensão é reproduzida em sua incapacidade de domínio da linguagem, sendo ludibriado por seu patrão e agredido por um soldado, tornando a relação campo versus cidade um ponto fundamental na obra.
Agora imagine um leitor estrangeiro, que não possua nenhuma referência sobre o Brasil e sua geografia. Provavelmente sua compreensão das duas obras será limitada e todas essas adaptações realizadas para tornar o cenário refletido na linguagem não terão nenhuma importância para ele. Pode ser que se concentre apenas em dizer se a história é boa ou ruim, se diverte ou emociona, ou se os personagens são bem ou mal construídos. Mas perceba que uma avaliação desse tipo será parcial ou até incorreta por falta de informações. O leitor poderá, por exemplo, dizer que o narrador de Rosa é inverossímil, pois ninguém fala daquele modo.

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08 novembro 2007

O que é qualidade literária? - Parte II

Referências Históricas

Um conto de Jorge Luis Borges, cujo título é "Pierre Ménard, Autor de Quixote" fala sobre um escritor do século XIX que escreve um livro exatamente igual ao clássico "Dom Quixote" de Miguel de Cervantes. A avaliação das duas obras, no entanto, é bem diferente. Na história, um crítico exalta a obra de Pierre Ménard como superior à do autor espanhol, sendo "mais sutil e infinitamente mais rico que o [Dom Quixote] de Cervantes". Embora pareça uma declaração absurda, o que o crítico faz no conto é analisar o contexto histórico em que as duas obras estão inseridas, o que nos ensina algo muito importante: o valor de uma obra se relaciona com o período em que ela é escrita.


Um bom exemplo da relação entre fatos históricos e uma obra literária é "A Revolução dos Bichos" de George Orwell. Um leitor que não souber nada a respeito da história da Revolução Russa e seus principais personagens, lerão o relato como uma fábula sobre a exploração causada pelo mau uso do poder político. No entanto, os leitores familiarizados com os eventos históricos da Revolução poderão relacioná-los ao relato e perceber que se trata de uma sátira aos ideais desta Revolução. Marx, Stálin, Trotski, Alexei Stakhanov são caricaturados nas ações e decisões tomadas pelos bichos no livro.


Naturalmente isso não significa que o valor de uma obra literária está vinculado somente ao seu conteúdo histórico, político ou social. Isso porque se uma obra se sustentar apenas por suas relações históricas provavelmente perderá seu valor à medida que o tempo passar. Fatos que são bastante conhecidos no presente poderão se tornar referência apenas a historiadores no futuro e seria inimaginável um livro que viesse acompanhado de uma lista de obras históricas que deveriam ser consultadas para que o leitor tire pleno proveito da ficção. Sendo assim, é possível afirmar que o valor de uma obra literária está em justamente utilizar elementos do presente para transcendê-lo, fazendo o leitor adquirir através da arte um ponto de vista diferenciado. Posteriormente falarei mais sobre a condição revolucionária ou reacionária de uma obra, portanto, deixo o tema em aberto.

Em resumo, o leitor que desconhece o período em que foi escrito o livro poderá não compreender pontos importantes, que fará com que sua avaliação em relação à obra seja negativa. Pode ocorrer, por exemplo, de o leitor dizer que não entendeu nada de um romance, que foi escrito numa linguagem propositalmente cifrada, apenas sugerindo ações ao invés de afirmá-las, em razão de um cerceamento de liberdades promovido por um governo autoritário. E possivelmente seu valor estará em justamente o autor conseguir expor seu ponto de vista apesar das condições conflitantes.

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06 novembro 2007

O que é qualidade literária?

Na tentativa de especificar o que faz uma obra ser valorizada em detrimento de outra – uma avaliação que muitas vezes parece ser contraditória, pelo número de exemplares vendidos de um livro –, começo uma série de textos que tentam falar sobre elementos que tornam uma obra reconhecida pela crítica e por que muitas vezes alguns leitores não gostam de um livro que é bastante valorizado. Algumas partes poderão parecer didáticas demais, mas parece ser um tom adequado para o início, o que permitirá inequivocamente seguir à maior discussão: afinal, o que é um bom livro? Num primeiro momento, pretendo falar sobre o assunto em doze ou treze partes. Escrevi somente a introdução, portanto, publicar em partes aqui servirá também de incentivo para que eu não abandone o tema.

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A avaliação crítica de uma obra parece ser algo inerente ao leitor, um personagem que dificilmente se torna indiferente aos livros que lê. Não é incomum um conhecido, ao nos encontrar com um livro na mão, perguntar se já lemos algum outro que ele diz ter gostado muito. Em contrapartida, o leitor que lê um livro e o considera ruim frequentemente passa a falar mal dele quando surge uma oportunidade. O papel do leitor crítico, capaz de identificar uma boa obra, é mencionado por Machado de Assis, num de seus melhores contos, intitulado "A Chinela Turca". Na história, o bacharel Duarte está de saída para um baile quando chega à sua casa o soporífero major Lopo Alves com um pacote em suas mãos que diz se tratar de um drama escrito por ele. O inevitável pedido vem logo em seguida:


"Sei que é inteligente e lido; há de me dizer francamente o que pensa deste trabalho. Não lhe peço elogios, exijo franqueza e franqueza rude. Se achar que não é bom, diga-o sem rebuço."

No entanto, é possível ter ocorrido a você, após ler críticas positivas a respeito de determinada obra, ficar curioso e, ao passar em frente a uma livraria, comprar o volume, para depois de uma penosa leitura, sentir-se decepcionado. Mais do que a decepção, você não compreende como um livro, que sob seu ponto de vista é bastante ruim, pode receber tantos elogios. Por que, em alguns casos, livros tidos como muito bons podem ser avaliados por vários leitores como muito ruins? Afinal de contas, o que define uma boa obra?

Um ponto fundamental para compreender esse abismo entre uma avaliação crítica e o leitor é reconhecer que existem muitos livros em um só. É impossível encontrar dois leitores exatamente iguais, com as mesmas expectativas ou com a mesma experiência cultural, social ou de leitura e, por causa disso, cada leitor poderá encontrar elementos diferentes numa obra literária ou deixar de reconhecer referências importantes colocadas pelo autor. As referências constituem elementos importantes para composição do texto literário, pois é um procedimento eficaz de multiplicação de sentidos num texto. No caso de um leitor menos experiente, muitas camadas de composição de uma obra literária poderão ser desconsideradas e o leitor se concentrará apenas na que está imediatamente visível, na maior parte das vezes o enredo. Essa falta de compreensão ou reconhecimento de referências pode fazer com que o leitor tenha um ponto de vista parcial de uma obra múltipla. Sendo a composição do leitor um ponto fundamental para avaliação de um livro, quais são os principais fatores que podem limitar o ponto de vista de uma leitura? Passarei a examinar alguns deles: as referências históricas, geográficas, artísticas, culturais, a intertextualidade e os recursos textuais.
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